As tentações do Ministério


Artigo publicado na Revista
Obreiro Liderança Pentecostal,
CPAD. Rio de Janeiro/RJ,
v.16 (23):outubro/2001.


INTRODUÇÃO

São muitas as tentações que afligem a igreja do Senhor. A Bíblia alude ricamente a esse respeito! O ministério e, por extensão, os ministros não estão imunes a essa aflição; ao contrário, são alvos prediletos das nefastas ações do Maligno e do mundo das trevas, por serem os principais agentes da proclamação da Palavra e expansão do Reino, na terra.

Jesus Cristo preocupou-se com isto quando reunido no Getsêmani com Pedro e os filhos de Zebedeu,. Entre angustiado e triste, pelo iminente Calvário, e decepcionado com a inépcia dos seus seguidores, Ele os advertiu: "Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é fraca." (Mateus, 26.41; e refs.).

Ele próprio fora vítima de um tríplice e violento assédio de Satanás e de uma diversidade de tentações dos homens. Sabia que o homem de Deus necessita manter uma estrutura espiritual sadia e forte para compensar as fragilidades da natureza carnal; manter o equilíbrio do ser para vencer os embates diuturnos, na forma das ardentes provas que vem para tentar os santos do Senhor (1 Pedro 4.12).

Os homens de Deus, ministros do altar, cidadãos dos céus em concomitante exercício da cidadania terrena, são passíveis das mesmas tentações que o homem comum, pois ambos sofrem influência do meio no qual vivem. O diferencial está na predisposição para aceitar ou rejeitar as atrativas ofertas da sociedade, e nos recursos utilizados no enfrentamento desses embates.

Neste artigo, abordaremos algumas das tentações que mais comumente afligem o ministério da igreja, posto ser impossível tratar de todas em uma matéria como esta, em razão das limitações da fonte, do canal e do veículo ora utilizado.

A tentação do sexo ilícito

É bastante provável que o sexo ilícito seja o principal motivo da queda de obreiros cristãos, ao longo da história da igreja. No mínimo, a tentação do sexo extraconjugal e as relações anômalas da sexualidade humana tem comprometido seriamente ministérios promissores, de homens e de mulheres, nas igrejas.

A exemplo do que ocorreu com Sansão, no conhecido episódio da mulher filistéia do Vale de Soreque (Juízes 16.16); e com Davi, no não menos famoso caso que manteve com a mulher do heteu, no terraço real em Jerusalém, muitos escolhidos de Deus têm sucumbido diante de questões má resolvidas de relacionamento com o sexo oposto.

Certa madrugada, fui despertado pelo toque do telefone; fato, aliás, rotineiro na vida de um ministro do evangelho. Tratava-se de uma ligação feita por um jovem obreiro, de um dos hospitais da cidade. Na vida secular, aquele irmão trabalhava na área de saúde. Aflito, ele pedia ajuda, pois estava sendo vítima de um dos "ataques" mais freqüentemente feitos aos homens: o assédio por parte do sexo oposto.

No início de minha carreira ministerial, lendo um dos clássicos de autoajuda cristã, deparei-me com a narrativa de uma cena que ora cabe ser lembrada. Um pastor psicólogo, tendo em seu gabinete uma cliente para orientação profissional, num determinado instante foi provocado sexualmente pela mesma, ao ponto de sair da sala e ir ao banheiro para dar vazão ao seu estímulo sexual, usando o mais juvenil de todos os escapes. Ao retornar ao gabinete, aquele homem sentiu-se mais senhor de sua natureza masculina e prosseguiu no atendimento à consulente, sem sucumbir a outras tentações carnais.

Rejeitando o mérito da complexa questão da masturbação como válvula de escape para as necessidades biológicas do homem, essa não foi a linha de conduta na qual me baseei para orientar o jovem obreiro notívago que me telefonou do hospital. Recomendei-lhe que não mais ficasse sozinho com a colega que o assediava; que se mantivesse em permanente estado de oração; e que, se tivesse momentos de folga em seu plantão, tomasse a Bíblia e a ficasse lendo num recanto do seu ambiente de trabalho. Esses cuidados o ajudariam a vencer a tentação que o estava provando, naquela madrugada.

Ao amanhecer, fui ao hospital visitar aquele obreiro. Encontrei-o sereno e feliz, dizendo que havia sido vitorioso no embate. Depois de duas ou três outras tentativas, aquela mulher não mais o havia perturbado.

Mais uma vez, cumprira-se a Palavra que diz: "Sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós" (Tiago 4:7).

A tentação da apropriação indébita de riquezas

Quando a Bíblia afirma que "o amor ao dinheiro é a raiz de toda espécie de males", ela também diz que "nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores" (1 Tm 6.10). A atração incontida pelo dinheiro tem sido uma das grandes tentações na vida ministerial (como também o é na vida secular). Nela, têm sucumbido pobres e ricos, ávidos por mais um centavo ou por incontáveis milhões!

Há muitos anos atrás, quando ainda servia como diácono, juntamente com mais dois outros diáconos, fomos constrangidos a participar de um estratagema elaborado para flagrar um obreiro que estava se apropriando de parte das ofertas coletadas na Casa do Senhor. Comprovado o fato, dias após, aquele pobre irmão foi disciplinado pela igreja. Muitos o aconselharam a reconhecer o seu erro, submeter-se com humildade à punição que lhe fora dada e demonstrar furtos de arrependimento. Ele optou por deixar a igreja, à qual jamais voltou a reintegrar-se.

Aquele homem queria tornar-se rico e escolheu o caminho que lhe pareceu o mais fácil: furtar o tesouro da igreja. Sucumbiu ante a verdade ensinada por Paulo a Timóteo (6:9): "Mas os que querem ser ricos caem em tentação e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína".

Certa ocasião, fui procurado por um colega de trabalho secular, também obreiro em uma das congregações evangélicas da cidade. Aquele irmão, entre constrangimento e angústia, relatou-me que estava refém de três agiotas, dos quais não tinha a menor condição de se libertar. Ele já não sabia o que fazer diante das repetidas cobranças, algumas das quais seguidas de ameaças. Sua situação era tal que - disse-me ele - a idéia do suicídio já lhe chegara à mente como única forma de ver-se livre do "inferno em vida" que estava experimentando. Perdera completamente a visão espiritual, em conseqüência da insensatez no uso do dinheiro

Orientei-o que procurasse os seus credores e tentasse negociar os débitos, do modo que pudesse honrá-los, ainda que a longo prazo. Caso não obtivesse êxito, procurasse a autoridade policial competente para resolver o seu caso e prestasse um depoimento fiel da situação. Dias após, soube que a Polícia Federal havia feito uma devassa em um conluio de agiotas, livrando alguns incautos que estavam em situação semelhante.

Hoje, aquele obreiro é um microempresário de relativo sucesso, vivendo o bem estar social e servindo com fidelidade na Casa do Senhor. Recentemente, encontrei-o estacionando um carro novo: "Pastor, olhe o que Jesus me deu... e não estou devendo nada! Paguei a vista, com o dinheiro do meu trabalho".

Glória a Deus por isto! Ah, se todo obreiro do Senhor se satisfizesse com a bênção de cada dia, para experimentar a essência do que o Apóstolo ensinou: "A paz de Deus, ..., domine em vossos corações; e sede agradecidos" (Colossenses 3:15).

Nesses últimos meses, o mundo evangélico nacional foi afetado por episódio dos mais desgastantes de sua história. Um ministro do evangelho de elevada envergadura nacional cedeu à tentação de fazer dinheiro fácil com a revelação de documentos oriundos do escabroso mundo dos interesses subalternos da politicagem. Segundo as últimas notícias veiculadas pela mídia, esse homem outrora tão feliz nada ganhou; foi "o primeiro pego com a mão na massa" e atropelado pela estultícia dos filhos das trevas.

Uma prestigiada revista de circulação nacional (1), registrou que o denunciado havia evocado "segredo de confissão" para não revelar nomes de outras pessoas envolvidas no escandaloso processo. Numa analogia com o sacerdócio levítico, observa-se que foi rasgado o estatuto dado pelo Senhor diretamente a Aarão e reforçado através do profeta Ezequiel: "... fazer diferença entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo" (Levítico 10.10) e ensinar o povo de Deus a"distinguir entre o santo e o profano e discernir entre o impuro e o puro." (Ezequiel 44:23).

Tudo, em conseqüência de um ministro sucumbir à tentação de conquistar riquezas terrenas através da apropriação indébita de dinheiro.

A tentação do culto à personalidade

Em artigo publicado no jornal Haaretz (2), Yossi Pnini, Diretor do Projeto Syllabus da Unidade de Educação na CEI, escreveu:

"Perscrutar a alma não é simplesmente uma questão de olhar-se no espelho. é analisar-se interiormente com lente de aumento e um bisturi. Quanto mais poderosa a lente, mais afiado o bisturi, mais efetiva a análise.

"Perscrutar a alma - continua o escritor - significa também dizer coisas que ferem".

E, entre essas "coisas que ferem", ele dispara:

"O culto à personalidade vem crescendo e se desenvolvendo até quase chegar a ser blasfêmia, pois de um certo ponto em diante ele é dirigido do alto. Quão alienado e estranho, e nem se faz necessário dizer, quão perigoso!"

Não é apenas o judaísmo que se preocupa com a questão do culto à personalidade, no meio religioso. Os espíritas também têm se pronunciado sobre o assunto. Milton Felipeli, discorrendo sobre "A preparação do homem no centro espírita" (3), emite a seguinte opinião:

"Há movimentos estranhos à doutrina e que se encontram infiltrados nos centros espíritas... que envolvem conceitos não espíritas e que se apresentam apenas para satisfazer o culto à personalidade de seus iniciadores". E sentencia: "Parecem espíritas mas não o são."

O tema ocupa até os que dizem não ter nada contra o 'culto à personalidade'. Da Internet, extrai-se o sentimento do jornalista e escritor Marcelo Baglione (4)

"Se eu fosse artista plástico, o meu Jesus não teria rosto algum, a tela ficaria vazia, mas cheia de Espírito. Entretanto, o seu semblante seria de abissal alegria. Mas, no final das contas, acredito que a criação de um novo rosto para o Filho de Deus seja algo desnecessário.

"Acho muito mais importante nos preocuparmos em sedimentarmos os princípios para uma sociedade cristocêntrica, embora não tenha nada contra este tipo de culto a personalidade, mas considero sentir, e até ver a realidade crística em si mesmo, muito mais relevante que buscar uma rosto que é a soma de todos os semblantes da Terra."

Que tal ouvir uma das vozes que Deus mais usou para dar uma guinada na história do cristianismo? Lutero, num esforço real para impedir o culto à personalidade, assim registrou o seu sentimento, em 1522:

"A primeira coisa que peço é que as pessoas não façam uso do meu nome e não se chamem “luteranas”, mas “cristãs”. Quem é Lutero? O ensino não é meu. Nem fui crucificado por ninguém. ... Como eu, miserável saco fétido de larvas que sou, cheguei ao ponto em que as pessoas chamam os filhos de Cristo por meu perverso nome?" (5)

 Lamentavelmente, esse desejo não foi atendido da forma almejada. Apesar da Igreja Luterana não cultuar o nome de um dos maiores teólogos e reformadores cristão de todas as épocas, o seu nome continua a identificar a denominação.

É doloroso observar, nos estatutos e documentos oficiais de muitas igrejas e denominações (principalmente, em envelopes e papel timbrado de larga circulação), a impressão do nome de ministros identificando "ministérios" e "pastorados" ad aeternu, como se os mesmos fossem o pedra basilar da igreja.

O culto à personalidade, segundo o modelo estimulado em nossos dias, manifesta a capitulação de alguns ministros a uma dupla tentação: a vaidade do ser e a vaidade do ter.

Nesses casos, há um grave desrespeito a uma das mais claras e objetivas lições do Senhor Jesus:

"Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra [JESUS] edificarei a minha igreja..."(Mateus 16:18a)

Experimentar o indescritível sabor de um elogio, todos já experimentamos e gostamos! Mas aceitar (e, principalmente, estimular) o culto à personalidade na Igreja do Senhor, é um desatino... é um desrespeito à memória daquele que deu Sua Vida e Seu Sangue pela humanidade perdida.

A tentação do poder eclesiástico temporal

Paralelamente à tentação do ser e do ter, emerge a tentação da conquista exacerbada do poder temporal nas igrejas (aqui, trata-se do poder de natureza político-institucional; não confundi-lo como o poder delegado por Cristo aos seus discípulos, conforme Mateus 10.1; Marcos 6:7 e outras refs.).

Tratando do que chama "A última Advertência", um site adventista (6), aventura-se a definir as sete cabeças da besta, no Apocalipse (12:3; 13:1; 17:3,7,9), como "as sete sucessivas formas governamentais romanas: reinado, consulado, decenvirato, ditadura, triunvirato, império e papado", e associa a sétima cabeça como o poder eclesiástico romano na revolução francesa de 1798.

Em seu trabalho "Inquisição Nunca Mais", o Pr Airton Costa alerta para a importância da questão do poder eclesiástico temporal, dizendo:

"Os evangélicos não devem esquecer os heróis da fé, os homens que, com ousadia, romperam com as tradições, com o poder eclesiástico de sua época, e ajudaram na implantação de uma igreja reformada, livre do poder papal, submissa a Jesus, e tendo a Bíblia Sagrada como única regra de fé e prática."  (7)

Nas últimas décadas do Séc. XX, a luta pelo poder nas igrejas ultrapassou os muros eclesiásticos. Tribunais de Justiça e Delegacias de Polícias foram transformados em fórum de litígio e palco de contendas para ministros e igrejas. Dois fatores aparentemente conflitantes contribuíram para isso: o sentimento imperialista que marcou as fases precursoras das duas grandes cisões do cristianismo; e uma ânsia divisionista sem precedentes. A luta pelo poder tem grassado igrejas, particularmente, as evangélicas.

Quando vista em seu contexto, essas duas manifestações revelam uma relação causa/efeito. A sede de mando que estimula a centralização do poder eclesiástico provoca segregação de pessoas e grupos os quais, por sua vez, promovem divisões e geram novos núcleos de poder.

Mínimas insatisfações motivam rupturas, seguidas da criação de novas igrejas, ministérios e denominações; como se o Corpo de Cristo fosse uma peça de carne em mãos de ávidos magarefes. Falta espiritualidade e sensibilidade à vontade unificadora do Espírito Santo. Essa falta é um fator determinante da desintegração das igrejas evangélicas.

Tratando dessa temática em uma recente palestra que realizou no Nordeste, Joyce E. W. Every-Clayton (8)lembrou a primeira confissão de fé congregacional (a Declaração de Savoy sobre Fé e Ordem, assinada em 1658), donde extrai-se o seguinte texto:

"O Senhor Jesus chama do mundo para a comunhão com Ele aqueles que lhe são dados pelo Pai... Os que assim são chamados... Ele manda que andem juntos em sociedades ou igrejas particulares... Para qualquer dessas igrejas assim reunidas... Ele deu todo aquele poder e autoridade que de qualquer maneira são necessários para que ponham em prática a ordem no culto e na disciplina que Ele instituiu para eles... Ao lado dessas igrejas particulares não foi instituída por Cristo qualquer igreja mais extensa... ornada de poder para a execução de qualquer autoridade em Seu nome..."

"Eis o nosso desafio, para não dizer, nosso dilema!" - disse a palestrante: "Como vivenciar diversidade total, lutar em prol da unidade, e sonhar com a identidade, quando, aparentemente, toda nossa eclesiologia milita fortemente contra isso? E não somente nossa eclesiologia! A própria lógica diz que o negócio é impossível! Diversidade, unidade e identidade não cabem dentro da mesma caixinha lógica."

Unidade não é necessariamente unanimidade, assim como não é necessariamente uniformidade: todos não têm que pensar igual nem ter o mesmo jeito de ser. É permitido ser diferente, desde que não se transgrida ao modelo de viver cristão esposado pelas Escrituras.

O alerta dos Apóstolos do Senhor parece totalmente esquecido:

"Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também. Para que não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual cuidado uns dos outros. (1 Coríntios 12:12,25)

"Há um só corpo e um só Espírito, ... uma só esperança ...; um só SENHOR, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós." (Efésios 4.4-6)

Cristo nos une e o Espírito nos une. Mas, a espiritualidade bíblica não é massificadora: há diversidade na unidade. Logo, de onde vêm as lutas e divisões no meio cristão? Tiago (4.1) responde: "Porventura não vêm disto, a saber, dos vossos deleites, que nos vossos membros guerreiam?

Aos ministros, ante a chama tentadora da conquista do poder eclesiástico temporal, relembre-se a advertência do Espírito:

"Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar" (1 Pedro 5:8).

A tentação da secularização da vida

Certo ministro do evangelho confidenciou-me, em meio tom de desabafo, o quanto era difícil para ele ser pastor durante a semana.

- "Aos domingos - dizia-me -, é bem mais fácil... tudo está no lugar... não há maiores problemas! Mas, a coisa muda de figura, depois da Bênção Apostólica!"

A análise desse obreiro parece estar correta! Na escola bíblica dominical, o pastor tem uma equipe, composta de superintendente, professores de classes e secretários que, se necessário, fazem todo o trabalho. Se há uma visita domiciliar ou uma atividade extra-templo, não é difícil encontrar companheiros.  No culto dominical, todos estão ansiosos para cooperar: coral, conjuntos, instrumentistas, presbíteros, diáconos e demais auxiliares, esperam ansiosamente a oportunidade de participar, da melhor forma. O templo ornamentado e as pessoas finamente trajadas transmitem sensação de bem estar e riqueza. Tudo convida à adoração, ao louvor, à pregação da Palavra. A espiritualidade transpira por todos os poros do organismo eclesiástico.

De segunda a sábado, porém, as coisas nem sempre são previsíveis e organizadas. A espiritualidade e o ambiente eclesial cedem lugar aos embates do mundo secularizado, no qual o pastor é concitado a responder aos desafios do caos social, no mundo contemporâneo.

Quando trata-se de um ministro de tempo parcial (principalmente, os que subsistem de proventos da vida secular), esse quadro torna-se ainda mais complexo. Como profissional cidadão, ele é obrigado a dar maior atenção ao emprego e ao cotidiano, que à vocação pastoral; e passa a servir ao Senhor e à igreja com o excedente do seu tempo e vigor físico diários.

Pastores que, durante a semana, poderiam estar com pessoas ou pequenos grupos para estudar a Bíblia e orar, visando à compreensão das Escrituras e ao desenvolvimento de vidas de oração (Peterson (9), chama isto de "o serviço de cura das almas"), estão envolvidos no caudal das rotinas de trabalho e nos embates com a ilicitude e com os vícios morais que grassam a sociedade. Isto, bafejado por tentações que vão desde a conquista de níveis mais elevados na hierarquia do trabalho, aos cargos mais avançados na organização político-social da comunidade. Quando muito, o trabalho de alguns desses líderes, no intervalo entre domingos, limita-se a “tocar a igreja”, a exemplo do que um comerciantes faz com sua loja ou um empresário com a sua empresa.

Mesmo assim, cada vez mais cresce o número de ministros que optam por deixar a dedicação exclusiva ao altar e aventurar-se nas atividades da vida secular, seja no campo da política partidária, do serviço público ou do mundo dos negócios privados.

Espero não ferir demasiadamente a hermenêutica e, na condição de obreiro em tempo parcial, não provocar o afloramento de suscetibilidades ao contextualizar a seguinte palavra, como orientação aos santos homens de Deus que são ministros do evangelho em tempo integral:

"Cada um fique na vocação em que foi chamado. Foste chamado sendo servo? não te dê cuidado; e, se ainda podes ser livre, aproveita a ocasião. Porque o que é chamado pelo Senhor, sendo servo, é liberto do Senhor; e da mesma maneira também o que é chamado sendo livre, servo é de Cristo. Fostes comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens. Irmãos, cada um fique diante de Deus no estado em que foi chamado." (1 Coríntios 7:20-24).

Conclusão

A Bíblia exorta a respeito das inúmeras tentações que afligem os santos, entre os quais os ministros da igreja. O próprio Jesus Cristo sofreu esses embates e advertiu seus discípulos para que se mantivessem em permanente estado de alerta e em oração, pois a robustez espiritual é fator determinante na superação das fragilidades naturais do homem.

Das tentações mais observadas no contexto das Escrituras e ao longo da história do cristianismo, como relações sexuais ilícitas e apropriação indébita de riquezas; até manifestações menos notórias de tentação provindas do reino das trevas e das fragilidades humanas, a exemplo do culto à personalidade, do poder eclesiástico e da secularização da vida; um incontável número de homens e mulheres de Deus sucumbiram ao pecado e macularam as vestes da santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor (cf. Hebreus 12.14).

Suportar a tentação, é dever do cristão, especialmente dos ministros do Evangelho. O pastor Tiago (1.12) enfatiza essa verdade, ao afirmar: "Bem-aventurado o homem que suporta a tentação; porque, quando for provado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor tem prometido aos que o amam."

O cuidado escriturístico com esse assunto é tal que dois dos maiores expoentes da igreja primitiva foram ágeis em reafirmar o socorro do Senhor para com os que são submetidos tentação. Paulo, escrevendo à Igreja em Corinto (10.13), confortou aos irmãos, dizendo: "Não veio sobre vós tentação, senão humana; mas fiel é Deus, que não vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará também o escape, para que a possais suportar." Enquanto Pedro, em sua segunda carta universal (2:9), lembrou: "Assim, sabe o Senhor livrar da tentação os piedosos, e reservar os injustos para o dia do juízo, para serem castigados".

Finalizando, vale ressaltar que o faro de um ministro ou sacerdote ser tentado não significa necessariamente que ele venha a cair em falta diante de Deus. Há escape nessa situação, "porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado (Hebreus 4.15).


* Todos os textos transcritos nesta matéria estão conforme a versão ARF.

(1)   Revista ÉPOCA ONLINE, Edição 156, 14 de maio de 2001.

(2)   Yossi Pnini Haaretz, A Agonia de Uma Alma Judia, 16 de novembro de 1995.

(3)   Milton Felipeli, A preparação do homem no Centro Espírita (In: Boletim Informativo de Análises, Estudos e Discussões Doutrinárias, Ano I - N.º 004 - Cuiabá, Agosto/1999).

(4)   Marcelo Baglione, Um novo rosto para o Filho de Deus, (http://aqui.cade.com.br/polemica/), 5 de novembro de 1999.

(5)   Timothy George, Teologia dos Reformadores (In: O Presbiteriano Conservador, Ed. Nov./dez./1995), p. 55.

(6)   Nilson Jones e Regina Cunha, http://www.asd-mr.org.br/folhetos/advert.htm

(7)   Airton Evangelista da Costa, http://evangelico-sp.vila.bol.com.br/pagesi.htm

(8)   Joyce E. W. Every-Clayton. Reflexões Introdutórias acerca de Identidade Denominacional. Palestra proferida em 1º de maio de 2000, no Seminário Teológico Congregacional do Nordeste.

(9)   Eugene H. Peterson, The Contemplative Pastor, Grand Rapids: Eerdmans, 1993, p. 57.